quarta-feira, outubro 13, 2004

Egon Schiele ao telefone



Pois bem.Então, como eu ia dizendo, Egon Schiele me telefonou dia desses. Não me lembro literalmente tudo que conversamos, mas entre lamentações mútuas, alguns trechos ainda me vêm à memória.
– Mario?
– Sim.
– É o Egon.
– Ora, como vai, tudo bem?
– A mesma vidinha de sempre...
Na maior parte da conversa, o austríaco queria saber como anda o Flamengo. Schile tornou-se rubro-negro quando no final dos anos 80 a Seleção Brasileira fez um amistoso na terra da valsa e o Andrade, meio-campista da Gávea, fez um golaço. Depois caimos em discussões menos importantes, entre elas, de onde viemos, para onde vamos, e os destinos da humanidade.
Nestes assuntos concluímos, em conjunto, coisas interessantes. Primeiro ele me falou de sua fixação pela figura feminina. De desenhá-las quase papanicolauensemente.
– De fato não há mais nada que valha tempo, tinta sobre a tela, que não seja a mulher. Concorda? Pois bem. Então, é para elas que dedico meus maiores esforços. Posteriormente, pinto a mim mesmo. Faço auto-retratos não por me achar interessante sobremaneira. Mas porque pinto para agradar a ninguem e talvez eu seja desagradável para a maioria, enfim...
– É mas identifico belas paisagens nas tuas pinturas e alguns motivos religiosos, alguns poucos santos e cristos...
– Sim, é verdade. Mas entre pintar o cristo e pintar a mim, não vejo diferença. Quando qualquer pintor consubstancializa a figura do cristo, na verdade pinta a sí mesmo.
– Concordo. Vou mais além, já percebeu que estes temas são os mais retratados na história da arte, a mulher e o cristo? Logicamente há frivolidades descartáveis de impressionistas como Monet, mas não gastaria uma linha ou minuto com esse lixo.
– Sim... não vamos perder tempo com isso... fale mais do cristo e da mulher.
– Tu mesmo bem definiste. Quando pinta o cristo, o homem pinta a sí mesmo. Da figura inicial de Adão à definitiva de cristo, todos os homens estão contidos nesta genealogia, do ponto de vista teológico.
– Sim, talvez. E a mulher?
– A mulher é o caminho da volta. Ora, viemos a este mundo atavés deste túnel de carne e nervos. Fomos arrancados no nosso nascimento do mundo que pertencemos e jogados aqui, como alguma forma de excremento.
– Interessante. Mas por quê caminho da volta?
– Ora, o homem tem a limitação, o costume, de regressar sempre por onde veio, de sair pela mesma porta que entrou. Não conhece mais do que um caminho. Então desde que nasce, o homem tenta regressar à origem. Daí vem a nossa necessidade de sempre estar tentando entrar nas mulheres, percebe?
– Sim, faz todo sentido. Talvez o sexo seja mais metafísico do que físico, então.
– Sim. Sexo nesse sentido, é praticamente religião. A tentativa do Religare... da volta. Não existe forma mais eficiente de oração que o sexo.
– Oh, é verdade. Mas há suas variações... dia desses até tentei entrar pelas portas do fundo de uma modelo minha.
– Sim, é compreensível. A porta de serviço me agrada também. Mas devemos compreender que nesse sentido não é diviinal. É um erro de caminho. Prazeroso até, mas que não te levará a lugar nenhum.
– É verdade, meu caro. Agora percebo porque as mulheres não engravidam pelo rabo. Interessantíssimo. Isto esta para além do funcionamento da máquina humana. É uma questão espiritual-metafísica-religiosa.
– Sim, meu caro. Concluo que a fornicação é mais santa que julgavam e a reiligão mais pornográfica que poderíamos acreditar. Sendo assim, considero tua obra mais beata e pura que qualquer santinho de carteira. Mais vale uma gravura de pintura tua que qualquer das orações de "são" ou "santo".
– Guardarei isto como um elogio, meu caro.
– É esta a intenção, prezado amigo.
– As tintas me chamam. Vou fazer algo pensando nisso e depois te mando por e-mail, ok? Um abraço para tí, Mario.
– Outro para você, Egon.



A mulher e a morte (1915), óleo sobre tela. Egon Schiele morreu em 1918, aos 28 anos de idade. Três anos antes escreveu a sua mãe: "Toda a beleza e nobres qualidades foram juntadas em mim... eu deveria ser um fruto que viveria em eterna vitalidade, para além desta década. Quão grande deve ser o teu prazer de ter me dado a luz"

terça-feira, outubro 12, 2004

Meu amigo gitano



Poucos de vocês sabem, mas eu tenho um amigo de origem cigana. Seu nome é Yerjo, que em siganês significa "menino de pés feios e mindinhos sem unha". Após atravessar os oceanos Índico e Atlântico em uma pequena carroça, a família do pequeno nômade achou por bem aportuguesar sua alcunha para Sergio.
Em sua segunda primavera, o pequeno nômade logo foi iniciado nas tradições de seu povo e ingressou na vida social. Batizado por uma tia, cumpriu o seu rito de passagem ao engolir um solitário em uma joalheria. A expulsão do diamante deu-se em meio à uma grande festa, embalada por cantos de buleria e tangos quaternários.
Aos três anos de idade, de comportamente humilde e inocente, o pequeno Yerjo ainda corria nu pelas ruas de Goias, grande reduto de famílias zorongas. Divertia os caxeiros viajantes lendo o destino nas cartas do Tarot e decifrando as misteriosas linhas escritoras do futuro nas palmas das mãos. Junto aos iguais de seu povo, a família Pecewaska acreditava que o centro do Brasil seria a escadaria até a Deusa Kali.
Os anos transformaram o garoto pardo em um pônei arredio e seu comportamento pueril feneceu frente os ímpetos da juventude. Desenvolveu rapidamente o tino comercial e herdou o hábito secular de vender tapetes. Em poucos anos, suas tapeçarias já se espalhavam ao derredor de vários logradouros da Região Centro-Oeste. A terra árida do Planalto Central já era pouco para sua sede de conquista.
A perspicácia do patriarca pecewaskaco abriu a cortina de novas searas. Novamente colocados na estrada, agora embarcados em um trailer luxuoso, a tradicional linhagem fincou as suas tendas em terras cariocas. Desde então os ramos da nobre família infiltraram-se nos mais diversos ramos da sociedade fluminense. Hoje encontramos representantes deste secular séquito em entidades do mais alto galardão, como a Maçonaria, a TFP, a ACM e o SPC.

Em idade adulta, mais uma vez, a Deusa Kali abençoou a vida deste viajor e colocou em seu caminho uma bela companheira, com mãos de ourives, prontas a lapidar o bruto diamante e dar-lhe ares menos abrutalhados. Esta representante do povo judaico não fugiu às responsabilidades impostas por Javé e desposou o nosso querido pagão, juntando definitavamente os povos mais antigos da face da terra. Um acontecimento único. Hoje, graças aos ensinamentos da jovem Danikovitz, nosso personagem parece ter freqüentado os mais refinados cursos de noivas da Socila e abandou as pulseiras e camisas espalhafatosas de gosto duvidoso.
Tenho muito orgulho deste meu amigo e sinto muito sua falta. Ultimamente não tenho contado com a companhia de tão querido casal. Visionário que é e desejoso de difundir a maravilhosa cultura de seu povo, este herói além-mar e além-séculos abriu uma filial de seu clã em terras de Tio Sam, onde pretende reestruturar a hierarquia de suas castas sociais. Vai, querido amigo! Extende os teus braços sobre todas as terras, porque o teu lar é o mundo e o teu tempo é para sempre!

Na foto, vemos o pequeno Yerjo oferecendo seus serviços de quiromancia e tarologia aos fotógrafos da National Geografic.

domingo, outubro 10, 2004

Ave, Adão! O Trabalho e sua maldição



Quem tiver ouvidos que veja. Eu odeio trabalhar. O Trabalho é uma maldição. Não sou eu quem está dizendo... está lá... está na Bíblia, em Gênesis, 3, 16-19. Vejam:
"Comerás o teu pão com o suor do teu rosto, até que voltes à terra de que foste tirado; porque és pó, e em pó te hás de tornar”.
Pois bem. A Eva deu ouvidos à Serpente. Adão fez pior; deu ouvidos à Eva. Estava tudo certo, estava tudo lá... era só esticar a mão e pegar. Mas esse viado desse Adão tinha que fazer merda e agora eu tenho que passar o domingo trabalhando. Adão, seu filho-da-puta!


sábado, outubro 09, 2004

Sobre o nome do Blog



Este é Chirstian Andersen, autor de várias histórias cheias de moral e ensinamentos como "O patinho feio" e "A pequena sereia". Depois de encher o saco de criancinhas ao redor do mundo com fábulas cheias de sapos, gansos e princesinhas, Anderesen escreve a genial "A roupa nova do Rei". Pra quem não conhece a história, aí vai um pequeno resumo:
Um imperador muito vaidoso é manipulado por dois políticos do PT que lhe vendem uma roupa inexistente. O Rei cego pela própria soberba, desfila frente aos probetões banguelas pagadores de impostos, vestindo apenas um boné do MST. Acreditando estar trajado com a mais bela roupa, o embriagado líder não exerga sua própria nudez. O povo, influenciado pelas Organizações Globo e seus jornalistas tendenciosos, suspira com a beleza da nova vestimenta imperial. Apenas um moleque, no meio da multidão, enxerga o óbvio e solta o grito de "O Rei está nú!". Logicamente, não lhe deram ouvidos; apenas sopapos. Bem, nada mais precisa ser dito!