quinta-feira, novembro 25, 2004

Ventos, flores e pedalinho

Um sopro, dos mais lívidos, tocou-me a fronte. Desses raros de se sentir, porque não somos atentos aos ventos e seus caminhos. Se cada homem é uma cidade em sí, algumas esquinas – falo de encontros – apresentam uma leveza insustentável, como no livro de Kundera. Frágeis como bolas de sabão, da mesma forma, vão-se em brisas. Guardem no coração, pois é impossível aprisionar forças da natureza. Sabendo que o ar escapa pelos dedos, ainda joguei a peneira sobre o redemoinho, como se fosse verdade a lenda de prender o Saci. Bem, eu tentei:

"(...) hoje ví flores com cara de cachorro-sem-dono, loucas por uma dona que as bem cuidasse. Achei que tuas brisas as fariam bem, então tomei a liberdade de te dar de presente para elas que, certamente, ficaram risonhas de orelha a orelha. Por outro lado, confesso que pensei que elas me passariam um e mail ou telefonariam para dizer se tinham gostado de tí. Mas bem sei que flores são muito ocupadas. Por precaução, já alertei aos cactos de minha casa que brisas são incertas; chegam quando menos se espera e vão nos deixando um alento nos cabelos. E algumas são boas demais, mesmo que somente nas lembranças. Porém, é certo que ventanias surgem de marolas de vento que, em determinado momento, enchem as velas de barcos modorrentos, fazendo até galeões velhos cruzarem oceanos. Enfim, flores e cactos estão alertas à imprevisibilidade do tempo. A mim, tem me dado prazer pensar na janela aberta que pode me trazer algum dos teus ares, sejam vendavais ou tais brisas. Mas não poderia deixar de te agradecer por elas (...)"

Pois bem. Como previa, os ventos cessaram. Mas tudo bem. Ao menos levo um sorriso no rosto, enquanto faço andar o pedalinho.