sexta-feira, março 18, 2005

Como nos velhos tempos...


– Escute, Srta. Esther. Se o aparelho tocar, faça-me o favor de atendê-lo de imediato, sim? É insuportável este ruído nos meus tímpanos a tirar-me a concentração.
– Pois não, Dr. Jacó. O senhor não ouvirá sequer o segundo toque. Catarei o fone de pronto!
– Admiro tua dedicação. É certo que tens um futuro promissor se continuares prestativa como tens sido.
– O senhor pode contar sempre com meus serviços, Dr. Jacó. Estou aqui para serví-lo da forma que melhor lhe convier.
– Não me dê idéias, Srta. Esther. A cabeça de um velho maldoso é capaz de gerar os mais impublicáveis folhetins.
– Os quais me agradaria muitíssimo a leitura.

Os olhos de Dr. Jacó correram a silhueta bem delineada de Srta. Esther e um temporal de pensamentos mundanos encharcou-lhe a alma. Uma secura imediata adstringiu-lhe a glote e uma furtiva gota de súor lambeu-lhe sofregamente a fronte. A secretária espalhou seus odores femininos pelo ar espesso da repartição abandonada pelo ponto facultativo de mais uma véspera de feriado. Mas algo além da postura caxias do velho burocrata a levara, naquela manhã, aos seus afazeres datilográficos. Havia alí, de parte a parte, uma vontade quase incestuosa

– Srta. Esther, se me permite o comentário... não pude deixar de notar a impecabilidade do brilho de teu salto agulha.
– Dr. Jacó, as vezes desconfio de que o senhor me observa de cima a baixo.

– Sim, Srta. Esther. Sobremaneira. Deveras.
– Te agradaria ver um pouco mais, Dr. Jacó?

O inusitado convite da rapariga seguiu-se de gesto memorável. Como uma dançarina de molin rouge, a jovem hasteou a barra da saia, exibindo a tenacidade jovial de seu par de pernas. A generosidade do movimento expôs sua cinta-liga, roubando de Dr. Jacó a última possilidade de remorso pela traição eminente. Derrubando o porta-retratos com a foto de sua esposa, a gorda Jussara, ignorou a dedicatória que jurava amor eterno e, decidido, partiu para o crime.

– Pois bem. Trataste de atiçar-me. O que farás agora pra evitar que eu arranque de tí o que desejo?
– O que farei, meu caro? Simplesmente nada. Não percebes que quero mesmo é que me tenhas como um objeto de uso contínuo? Quero sentir tuas mãos me batendo como a um carimbo, me apertando como a um grampeador e me alargando como a um elástico de borracha.
– É uma das apologias mais descabidas que já ouvi, Srta. Esther. Mas não pensarei duas vezes em praticá-la.
– Dr. Jacó. O cheiro de tua acqua velva me inebria as idéias. Me desnorteia. Se não me apoiar em teu colo sou capaz de desmaiar aqui mesmo neste chão. E não poderia responder mais por mim mesma. E qualquer cão vadio poderia aproveitar-se de mim neste instante.
– É melhor então que te deites sobre minha mesa, que é espaçosa e sem uso. O que me preocupa é o óleo de peróba que poderia manchar tuas roupas.
– Ó, Dr. Jacó. Então só me resta despir-me, concorda?

A moça descartou peça a peça o vestuário, sempre a fitar os olhos de seu superior que, rapidamente, também tratou de livrar-se das calças, camisa e paletó, ficando somente com o sapato preto e as meias sociais. O janota fartou-se das volúpias da assistente, sem qualquer tipo de cerimônia, incorrendo inclusive em práticas sodomitas que sempre abominara. Desde então não se passa semana sem que Srta. Esther leve uma carimbada e seu sorriso, de orelha a orelha, comprova ter adorado a General Eletric, recém-chegada e embrulhada para presente, em seu kitnet no Méier.