sábado, dezembro 11, 2004

Foi... Episódio final

Na saída da escola parei em um boteco próximo e comprei as duas carteiras de cigarro que a Madame encomendara. A nota de dinheiro que havia me dado não era suficiente e ainda tive que tirar centavos de cruzeiro da passagem do ônibus. Mas era por uma nobre causa; somente as mulheres devem ter seus vícios alimentados. Como voltei a pé, correndo, cheguei esbaforido e depois do horário combinado. Apertei o meu andar e subí até o 6º pelas escadas.

Toquei a campainha com os charms e o estômago nas mãos.

– Entra. Você está atrasado.
– Tive que voltar a pé da escola. Estava sem dinheiro pro ônibus.
– Que seja, meu filho. Que seja...
– Olha aqui os seus cigarros, Dona Isadora.
– Não tinha box?
– Não sei...
– Deixa pra lá. É a mesma coisa. Está com sede? Quer água?
– Quero sim, senhora. Obrigado.

Quando Dona Isadora abriu a porta da geladeira, a luz transpareceu sua camisola, que anos depois aprendi chamar de combinação. Foi a primeira visão paradisíaca da minha vida, fora as arquibancadas do Maracanã. Era, de fato, pouco pano para cobri-la de maneira descente. As alças eram muito finas para sustentar o tecido acetinado sobre um par de seios maduros e o decote generoso mal cobria o "Y" de seu colo.

Me deu o copo nas mão e sentou-se em uma poltrona num dos cantos da sala. O apartamento estava escuro, protegido pelas cortinas pesadas que escondiam o sol que batia de frente no horário da tarde, transformando o ambiente em um forno. Estávamos suados os dois. E eu não sei qual tipo de calor, de fato, eu sentia.

– Garoto, sabe mexer naquela vitrola?
– Sei sim.
– Ótimo. Procura um disco de capa escura que está nessa pilha sobre a cadeira.
– Este aqui?
– Esse mesmo. Coloca a última do lado B.

Pesei demais a mão e a agulha deu uma pulada ainda no final da faixa anterior e fiquei preocupado de ter arranhado o disco. Em seguida, entrou a música que a Madame pedira.

– Senta nessa poltrona de frente pra mim.

Acendeu o último cigarro de um de seus maços e ficou me olhando, enquanto eu pingava no veludo avinagrado de sua mobília de gosto duvidoso. Com os primeiros versos de um tango ela começou a sequência mais inesquecível de minha vida adolescente.

"Na te debo

Na me pido
Me voy de tu vera, olvidame ya
He pagao con oro tus carnes morenas
No maldigas, paya, que estamos en paz"

Dona Isadora deixou cair a primeira alça de sua combinação e me mostrou seu seio esquerdo. E me olhou nos olhos. Passou o indicador nos lábios e cuspiu sobre o dedo. Em seguida, esfregou a saliva no seu mamilo que, de imediato, enrijeceu. Sempre tive olhos grandes, mas acredito que nesse momento eles estivessem tão exagerados que eu parecesse um peixe-binóculo de aquário.

"No te quiero

No me quieras
Si tu me lo diste, yo na te pedí
No me echas en cara que to' lo perdiste
También a tu vera yo todo perdí"

Foi-se a segunda alça. Ela desencostou da poltrona e estufou o tórax, assumindo ares de escultura grega de mármore branco. Segurou os seios por baixo, enchendo as mãos, ora os apertando, ora os sacudindo. Certamente percebeu meu olhar extasiado e o tergal da calça colegial cagoetou minha excitação. O amargo de minha gastrite precoce me veio à boca. Seu coro de 666 anjos caídos me ordenou de maneira inconteste:

– Vem, garoto. Vem te servir.

"Bien paga

Si tú eres la bien paga
Porque tus besos compré
Y a mi te supiste dar
Por un puñao de parne
Bien paga, bien paga
Bien paga fuiste, mujer"

Levantei do estofado, parei em frente à sua poltrona e me ajoelhei, como aprendera nas aulas de catecismo, para finalmente receber o sacramento de minha primeira comunhão. Apalpei e abocanhei suas tetas macias de grandes auréolas. Quando a língua de Dona Isadora me invadiu a boca senti o gosto do tabaco e sua respiração sôfrega e pesada me fez concluir que seria melhor que ela parasse de fumar.

– Levanta, garoto. Fica de pé.

Em pouco tempo me foram as roupas, inclusive a camisa com escudo do colégio no bolso. Beijou minha barriga, minha virilha, esfregou seu rosto no meu sexo e o segurou com força, muita força. Começou a manejá-lo freneticamente até colocá-lo de uma só vez na boca. Desde minha febres infantis não sentia calor tão intenso e não lembrava de minhas pernas tremerem tanto. As unhas da Madame correram meu peito e minhas pernas. Doeu, mas não foi ruim.

"No te engaño

quiero a otra
No creas por eso que te traicioné
No cayo en mis brazos
Me dio solo un beso
El único beso que yo no pagué"

Deitou-me no chão, com as costas sobre os tacos de madeira. Ficou de pé, me emoldurando com suas pernas, em um ponto de vista monumental. Sacou da cintura a peça que ainda a semi-vestia. Os cabelos de sua vulva, naturalmente grandes, desenhavam pequenos caracóis que escondiam mais do que mostravam. Desceu lentamente o corpo, ficando de cócoras, parando sua cabeleira por demais perto de minha ereção. A posição entreabiu seus lábios e pude ver o seu interior, desabrochado como uma rosa vermelha. E, como até então, eu nunca havia recebido flores, seria muito bem vinda a novidade.

Segurou com as pontas do dedo minha glande e a enconstou no seu carmesin. E deixou o peso de seu corpo fazer o resto. E um grito nos escapou dos rins, eu acho. Apoiou-se com os cotovelos ao lado de minha cabeça e seus seios penderam sobre o meu rosto. Ordenou que os mordesse. Atendi, logicamente. Esfregou-se sobre mim, de todas as formas, para cima e para baixo, de um lado a outro, em movimentos circulares. Me deu mais ordens que não entendi, mas que mesmo assim tentei cumprir:

– Ainda não, menino. Ainda não. Espera só mais um pouco.

"Na te pido

Na me llevo
Entre esas paredes dejo sepultas
Penas y alegrias, que te doy y me diste
Y esas joyas que ahora pa' otro luciras"

Em determinado ponto da conversa seus movimentos aceleraram e um choque elétrico me correu de trás das orelhas até os dedos mindinhos e senti que havia um formigueiro dentro de mim.

– Isso, moço. Agora. Agora. Agora, moço.

Quando as minhas formigas correram para dentro de suas carnes, Dona Isadora expulsou um jato cristalino, que me batizou e banhou o chão de sua sala. Desabou seu peso sobre mim, me cobrindo a respiração com os cabelos. Minhas pernas indicavam ainda uma ou outra corrente elétrica. Ficamos assim alguns minutos até que se levantou e fez um rabo-de-cavalo com um elástico. Observou a Phillips vermelha girando sem parar o final do LP, já sem tocar qualquer música. Retomou sua posição na poltrona e me orientou a ir até o seu armário do banheiro.

– Me traga a garrafa de álcool.

Da mesma forma, voltei a ficar à sua frente, como havia vindo ao mundo; ou quase. Derramou um pouco do líquido nas mãos e me segurou pelo cabresto. Tentei escapar, mas ela me prendeu. Senti uma ardência insuportável e uma lágrima fugiu-me do olho.

– É preciso,moço. Não há prazer que não traga alguma dor a reboque. Mas não se esqueça que da vida só se leva isso. Dores e prazeres. Espero que a balança te seja favorável, meu querido. Quando sair, leva essa carteira de cigarro vazia e joga na lixeira, por favor.

A encontrei ainda poucas vezes no elevador. Mas, em menos de um mês, mudou-se. Não deixou endereço. Nunca mais a vi. Nunca esqueci. E o que me ensinou tem se mostrado verdade até hoje.



Não joguei fora a carteira de cigarro como Dona Isadora pediu. E a música, que levei anos para encontrar, se chama "La Bien Paga", de R. Perelló e J. Mostazo, gravada por Canaro e Eduardo Adrián, em 1942.